O INIMIGO OCULTO
Conhecemos, todavia, muitas coisas deste mundo diabólico, que dizem respeito à nossa vida e a toda a história humana. O Demônio é a origem da primeira desgraça da humanidade; foi o tentador pérfido e fatal do primeiro pecado, o pecado original (cf. Gn 3; Sb 1,24). Com aquela falta de Adão, o Demônio adquiriu um certo poder sobre o homem, do qual só a redenção de Cristo nos pode libertar.
Trata-se de uma história que ainda hoje existe: recordemos os exorcismo do batismo e as freqüentes referências da Sagrada Escritura e da Liturgia ao agressivo e opressivo “domínio das trevas” (Lc 22,53). Ele é o inimigo número um, o tentador por excelência. Sabemos, portanto, que este ser mesquinho, perturbador, existe realmentee que ainda atua com astúcia traiçoeira; é o inimigo oculto que semeia erros e desgraças na história humana.
Deve-se recordar a significativa parábola evangélica do trigo e da cizânia, síntese e explicação do ilogismo que parece presidir às nossas contrastantes vicissitudes: “Inimicus homo hoc fecit” (Mt 13,2). É o assassino desde o princípio… e “pai da mentira”, como o define Cristo (cf. Jo,44-45); é o insidiador sofista do equilíbrio moral do homem. Ele é o pérfido e astuto encantador, que sabe insinuar-se em nós através dos sentidos, da fantasia, da concupiscência, da lógica utópica, ou de desordenados contatos sociais na realização de nossa obra, para introduzir neles desvios, tão nocivos quanto, na aparência, conformes às nossas estruturas físicas ou psíquicas, ou às nossas profundas aspirações instintivas.
Este capítulo, relativo ao Demônio e ao influxo que ele pode exercer sobre cada pessoa, assim como sobre comunidades, sobre inteiras sociedades, ou sobre acontecimentos, é um capitulo muito importante da doutrina católica, que deve ser estudado novamente, dado que hoje o é pouco. Algumas pessoas julgam encontrar nos estudos da psicanálise ou da psiquiatria, ou em práticas evangélicas, no principio da sua vida pública, de espiritismo, hoje tão difundidas em alguns países, uma compensação suficiente. Receia-se cair em velhas teorias maniqueístas, ou em divagações fantásticas e supersticiosas. Hoje, algumas pessoas preferem mostrar-se fortes, livres de preconceitos, assumir ares de positivistas, mas depois dão crédito a muitas superstições de magia ou populares, ou pior, abrem a própria alma – a própria alma batizada, visitada tantas vezes pela presença eucarística e habitada pelo Espírito Santo – às experiências licenciosas dos sentidos, às experiências deletérias dos estupefacientes, assim como às seduções ideológicas dos erros na moda, fendas estas por onde o maligno pode facilmente penetrar e alterar a mentalidade humana.
Não quer dizer que todo o pecado seja devido diretamente à ação diabólica; mas também é verdade que aquele que não vigia, com certo rigor moral, a si mesmo (cf. Mt 12,45; Ef 6,11), se expõe ao influxo do “mysterium iniquitatis”, ao qual São Paulo se refere (2Ts 2,3-12) e que torna problemática a alternativa da nossa salvação.
A nossa doutrina torna-se incerta, obscurecida como está pelas próprias trevas que circundam o Demônio. Mas a nossa curiosidade, excitada pela certeza da sua doutrina múltipla, torna-se legitima com duas perguntas: Há sinais da presença da ação diabólica e quais são eles? Quais são os meios de defesa contra um perigo tão traiçoeiro?
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